Do recrutamento e de como continuamos a ser um país de corporações

Sendo evidente que o conservadorismo na base da idade, na hora de recrutar, é um pequeno drama, com consequências que nos começam a ultrapassar a todos e possivelmente só se resolvem importando capacidade de trabalho, gostaria de referir hoje outro nível de conservadorismo, porventura maior, mais absurdo e ainda mais destrutivo.

Com mais ou menos rigor histórico, creio que será pacífica a ideia de que durante o Estado Novo se consolidou a organização da nossa sociedade com base em corporações.

Tendo, há poucos dias, o nosso número de dias em liberdade ultrapassado o número de dias em ditadura, seria de esperar que alguns dos dogmas do passado já se tivessem esfumado.

Não.

Na hora de recrutar, a experiência prévia no setor parece ser um toque de Midas. Se não trabalhaste no setor, não podes trabalhar no setor ou vales muito menos do que quem trabalhou no setor.

Esta ideia, profundamente enraizada no recrutamento incumbente, é desmentida por muitos casos de sucesso que conhecemos e que infelizmente são mais a exceção do que a regra.

Podemos nós imaginar onde estariam em termos tecnológicos, tantos setores, se não estivessem a utilizar princípios de automação nascidos no setor automóvel? Como teria esse conhecimento ido parar a outros setores se pessoas do automotive não tivessem começado a intervir noutras indústrias?

Tenho a convicção clara de que mais do que a experiência setorial, a exposição prévia ao tipo de gestão (multinacional,
familiar, pública), isso sim, aumenta muito a probabilidade sucesso.

A inclusão de bons profissionais de outros setores é fundamental para que um setor aprenda. A ideia de que 100% do conhecimento relevante para um setor ser bem sucedido está dentro desse setor é um erro no qual não devíamos insistir.

Infelizmente, insistimos, talvez porque alguns dos que avaliam e tomam estas decisões também estiveram sempre no mesmo setor.

Este post não é sobre nenhum indivíduo ou organização específica. É sobre uma forma de pensar enraizada e, a meu ver, destrutiva e profundamente errada.

Haverá felizmente exceções e pela nossa parte apenas gostaríamos que estas se tornassem regra. Se calhar o que necessitamos às vezes é de um par de “olhos frescos” sobre os nossos problemas de sempre, sobretudo quando a alternativa é repetir receitas que não produziram resultados